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D. Victoria quiz ser informada da doença de Henrique. Este passou a fazer-lhe uma exposição igual, com pequenas variantes, á que fizera á tia.

Mencionou, como a ella, aquelles vagos symptomas, aquellas tristezas, impaciencias e desalentos, que tão ingenuamente a boa senhora classificára como mania.

Emquanto Henrique falava, Magdalena poz-se a rir.

Henrique tornou para ella os olhos.

― Ó menina, de que ris tu? ― perguntou D. Victoria, com certo tom de severidade.

― Rio-me d’aquella doença, tia. Pois já viu alguem padecer d’aquillo? Ora diga?

― Eu?... mas...

― Pode dizer que não. E comtudo o primo Henrique não mente. Ha d’aquellas doenças na cidade, ha; mas na aldeia são tão raras, que eu mesma as estranho já, eu que as vi em outro tempo...

― Então não crê na realidade d’ellas.

― Não lhes estou a dizer que sim? Ouço até que já teem levado ao suicidio. Acredito-o. Os habitos da civilisação affeiçoam a seu modo a natureza humana e criam molestias novas, que nem por isso são menos naturaes. Mas que quer, primo? A minha estranheza, ao vêr um d’esses doentes em plena aldeia, não é modificada por todas essas considerações. É como um homem de casaca e gravata branca; não ha nada mais sério e mais grave n’uma sala de baile, mas colloque-m'o n’um monte, e diga se o pode olhar a sério.

― Quer dizer que não devo queixar-me aqui, sob pena de zombarem de mim.

― Tanto não digo; mas não o entenderão; isso não.

― Porém a minha doença não é só d’essas, que se não dão na aldeia, prima Magdalena; eu creio que verdadeiras desordens organicas...

― Ah! tambem? ― Com esse aspecto de robustez?!...