MONTEIRO LOBATO
171

perfuma-se todo. Diz que sabio de verdade é assim — bem sujinho...

— O senhor visconde, ordenou o menino, vae ficar no alto da janella com o binoculo de vóvó para espiar a estrada. Assim que apparecer uma poeirinha lá longe, avise. Agora vou buscar Rabicó.

Rabicó veio de má vontade como sempre, porque fôra obrigado a interromper uma comilança de mandioca. Pedrinho amarrou-lhe na cauda a celebre fitinha vermelha e pendurou-lhe das orelhas dois brincos de amendoim.

— O senhor vae-me ficar na porta para ir recebendo os convidados. Assim que chegar um, abra a porta, pergunte quem é e annuncie: "O senhor ou a senhora Fulano de Tal!" Mas comporte-se e não vá comer os brincos como da outra vez, ouviu?

Emquanto isso Narizinho dizia á boneca, que encontrou a varrer furiosamente, com o pincel de gomma arabica que lhe servia de vassoura, um lugar do chão que o visconde sujara de verde com o seu bolor.

— Chega, Emilia ! Assim você fura o soalho de vóvó. Antes vá tomar banho e vestir seu vestido côr do pomar com todas as suas frutas. Ponha ruge, não esqueça. Está um tanto pallida hoje...

A boneca, téc, téc, téc, muito esticadinha para traz, foi vestir-se. Assim que ella sahiu, o visconde, já no alto da janella de binoculo apontado, annunciou numa voz rouca de sabio embolorado:

— Estou vendo uma poeirinha lá longe !...

— Ainda não, visconde ! E' muito cedo. Temos de ir tomar café primeiro. Só na volta é que o senhor começa a ver poeirinhas.

O café, que já estava na mesa, foi tomado de galope. Vendo aquella pressa, dona Benta perguntou :

— Que reinação vamos ter hoje, Narizinho ?

Nem é bom falar, vóvó! Vae ser uma festa linda,