MONTEIRO LOBATO
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uma pilula tirada da barriga dum sapo, comecei a falar immediatamente.

— Emilia fala muito bem, explicou Narizinho. Pena é que diga tanta tolice.

O grego sorriu com malicia.

— Nós, sabios, não fazemos outra coisa, disse elle. Mas como dizemos nossas tolices com arte, o mundo se illude e as julga alta sabedoria! Vamos, bonequinha, diga uma tolice para o velho Esopo ver.

— Emilia desapontou e, torcendo a ponta do seu lencinho de chita, respondeu com muito proposito:

— Assim de encommenda, não sei...

Os dois fabulistas trocaram um olhar de intelligencia, como quem diz: Vê? Em seguida ferraram uma discussão a respeito da origem das fabulas — e, afastando-se dalli, foram sentar-se numa pedra á beira do ribeirão.

Encontrando-se sós, os meninos começaram a planejar grandes aventuras.

— Eu quero ver um leão! Quero conhecer o leão da fabula! disse Pedrinho.

— Eu quero ver aquelles dois pombinhos, do apologo tão bonito que vóvó contou, disse a menina.

— E eu quero pegar um tatú canastra, disse Emilia.

Era a terceira vez que Emilia falava em tatú canastra. Narizinho ficou intrigada.

— Que tatú canastra é esse em que você tanto fala, Emilia?

A boneca respondeu sem demora:

— E' que a canastrinha que "trago" sempre commigo "me" dá muita canceira. "Tenho" de carregal-a no lombo do visconde o tempo inteiro. Ora, se pégo um tatú canastra, fico dona duma canastra que anda por si mesma nos seus quatro pés. Não acham que é boa idéa?

— E' a maior idéa que a senhora teve até hoje, marqueza! exclamou o visconde.