MONTEIRO LOBATO
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podemos ver o leão sem que elle nos veja. Sigam-me, sem fazer o menor barulhinho.

Todos o seguiram, pé ante pé, como gatos. Subiram um pouco pela rocha e por fim alcançaram a tal fresta, que ficava bem no alto da caverna, em ponto que as féras não poderiam alcançar, nem que pulassem. Podiam dalli ver tudo sem o menor perigo.

Cada qual se ageitou por lá como melhor poude, com um olho na fresta.

— Lá está elle! disse Pedrinho, que foi o primeiro a ver o leão. Lá está o Leão da Fabula no seu throno de ossos, rodeado de toda a côrte!...


VIII — OS ANIMAES E A PESTE


O leão havia reunido a bicharia toda afim de resolver sobre a terrivel peste que estava arrazando o reino. Antes de decidirem qualquer coisa os reis costumam consultar os sabios, os astrologos, os bobos da côrte e outras notabilidades do reino. Assim tambem fazia o Leão da Fabula.

O primeiro consultado foi um macaco de barbas brancas, sabido como elle só.

— Qual a sua opinião, senhor Mono, sobre a peste que nos desgraça?

O macaco alisou a barbaça, tossiu tres vezes e disse:

— Saiba Vossa Majestade que esta peste é um castigo do céu. Offendemos as majestades celestes, foi isso. Agora, o remedio é aplacarmos a colera dos deuses, sacrificando a um de nós.

— Muito bem, disse o leão. Mas sacrificarmos ao qual?

— Ao mais carregado de crimes, respondeu o macaco.

O leão fechou os olhos e poz-se a meditar. Recordou sua vida passada, suas injustiças, a crueldade com que matara tantas zebras, gazelas, veados, carneiros e até homens.