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A PENNA DE PAPAGAIO

Resolveu fazer um bonito: offerecer-se para o sacrificio como o mais carregado de crimes.

Nenhum animal teria a coragem de concordar com elle, de modo que fazia um bonito sem correr o menor perigo. Assim fazem os reis que desejam ficar famosos na historia.

— Amigos, disse elle com cara de contricção. Nenhuma duvida me resta que quem deve ser sacrificado sou eu. Ninguem commetteu mais crimes que o vosso rei leão, ninguem matou maior numero de veados, carneiros, zebras e homens, do que eu. Devo ser o escolhido para o sacrificio. Que acham?

Disse e correu os olhos pela côrte, com ar de quem está pensando lá por dentro: "Quero só ver quem tem o topete de achar que sim."

Todos estavam convencidos que realmente era o leão o maior criminoso da floresta, mas nenhum tinha a coragem de lh'o dizer. A raposa, então, adeantou-se e fez um discursinho.

— Bobagens, Majestade! disse ella. Se ha no mundo um ente limpo de crimes, certo que é o nosso bondoso rei leão. Matou veados e carneiros e zebras e homens? Oh, isso em vez de crimes constitue actos de nobre piedade. Para que servem taes bichos? Que é um veado ou uma zebra ou um carneiro ou um homem, na ordem das coisas? Perfeitas immundicies, de modo que o que Vossa Majestade fez foi apenas uma obra de limpeza. Ninguem tome minhas palavras como lisonja, tenho horror a isso, mas Vossa Majestade, na minha opinião, em vez de ser um criminoso, é um santo!

Uma chuva de palmas cobriu o discurso da raposa. O leão lambeu a bigodeira, de gosto, e agradeceu á raposa com um gesto cordeal.

Em seguida levantou-se o tigre e disse o mesmo que havia dito o leão. Accusou-se de grandes crimes e declarou que o merecedor de castigo só podia ser elle, não outro.

A raposa fez novo discurso ainda mais bonito que o pri-