Fui caminhando o mais que pude no pouco tempo, que restava da noite: recolhi-me em um bosque solitário, onde a fraqueza, e cansaço julguei dariam fim a meus infortúnios; porém não o consentiu assim o fado, pois não era ainda satisfeito de meus trabalhos. Continuando a fugir, não podia andar sem grande incômodo; porque pelo muito, que cansava, me era logo preciso buscar onde me escondesse. Era tal medo, com que me via no escuro da noite pelos campos, que algumas vezes me parecia ouvir desordenados gritos, extraordinários assobios, e medonhas vozes, tudo efeitos do medo, e esperava nas noites de luar não ir tão aflita; mas chegadas que foram, me sucedeu pelo contrário, porque via fantasmas, com que as deliciosas sombras dos arvoredos aumentavam o meu horror; enfim a fome era contínua, em quanto ela me não ensinou a comer frutas agrestes, e ervas, conforme as produzia a terra. Também aproveitava de alguns bichos, que se criavam nos rios, comendo-se logo que podia apanhá-los; os olhos transformados em vivas chagas pela contínua corrente das lágrimas, iam perdendo a luz, que me encaminhava; a cor do rosto estava tão destruída pelo contínuo pavor, e aflição de espírito, que uma tarde, chegando a um regato