A alegria da infância com todos os seus risos e folguedos, com todos os seus brincos e inocentes desvarios, se lhe havia convertido na pesada tristeza da velhice com todas as suas dores e achaques. Oferece porém a natureza humana entre os seus contrastes também suas compensações, e com o correr dos anos a perda da vista lhe foi compensada de alguma sorte com a luz da inspiração poética, com o talento e a facilidade de improvisar, como ela mesma o diz:
.............................Eu vivo, pois não sinto
Tão vivas impressões dentro em minh’alma?
E na mente não tenho essa centelha,
Esse fogo divino, que me aquece?
Dentro em meu coração não sinto sempre
Esse foco de amor, que ao Céu me eleva?
Não envio a meu Deus os puros hinos,
Que por um mesmo impulso se originam?
E pois essa menina tornou-se depois poetisa, e veio a ser conhecida sob o nome de Delfina Benigna da Cunha.11
Ela nasceu em 17 de junho de 1791, e uma de suas primeiras composições foi o seguinte soneto, em que chorou a desgraça com que ainda nas faixas infantis a ferira a enfermidade, e que é digno de ser lido pela melancolia que reina em seus harmoniosos versos:
Vinte vezes a Lua prateada
Inteiro rosto seu mostrado havia,