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CARTAS DE INGLATERRA

exercito afghan com as suas cimitarras de melodrama e as suas veneraveis colubrinas do modelo das que outr’ora fizeram fogo em Diu. Ghasnat está livre! Candahar está livre! Hurrah! — Faz-se immediatamente d’isto uma canção patriotica; e a façanha é por toda a Inglaterra popularisada n’uma estampa, em que se vê o general libertador e o general sitiado apertando-se a mão com vehemencia, no primeiro plano, entre cavallos empinados e granadeiros bellos como Apollos, que expiram em attitude nobre! Foi assim em 1847; ha-de ser assim em 1880.

No emtanto, em desfiladeiro e monte, milhares de homens que, ou defendiam a patria ou morriam pela fronteira scientifica, lá ficam, pasto de corvos — o que, não é, no Afghanistan, uma respeitavel imagem de rhetorica: ahi, são os corvos que nas cidades fazem a limpeza das ruas, comendo as immundicies, e em campos de batalha purificam o ar, devorando os restos das derrotas.

E de tanto sangue, tanta agonia, tanto luto, que resta por fim? Uma canção patriotica, uma estampa idiota nas salas de jantar, mais tarde uma linha de prosa n’uma pagina de chronica...

Consoladora philosophia das guerras!

No emtanto a Inglaterra goza por algum tempo a «grande victoria do Afghanistan» — com a certeza