ar mole, de mulher grávida, com aquelas pálpebras descaídas, a comerem-lhe os olhos, com aquele sorriso apalermado, aquela voz derramada pelos cantos da boca, que nem um caldo frio e seboso.

De quando em quando sofria de insônias, e, justamente nessas ocasiões, nas horas compridas da noite em claro, é que mais detestava Pereira. Punha-se a contemplá-lo longamente, com asco, fartando-se de olhar para aquele "pamonha", aquele "coisa inútil", que ali ao seu lado, dormia todo encolhido, com as mãos entre as coxas. Vinham-lhe frenesis de enchê-lo de pescoções. Já lhe não podia suportar o cheiro doentio do corpo; não lhe podia sentir a umidade pegajosa do suor e a morna fedentina do hálito.

A sua ligação àquele mono era uma história muito triste e muito sensaborona. Poucos, bem poucos a sabiam, porque Lúcia se esforçava quanto lhe era possível por escondê-la, como quem esconde uma chaga vergonhosa.

Ela, "a mísera senhora", vinha, entretanto, de gente honesta e bem conceituada, se bem que muito pouco escrupulosa em pontos de educação. Deram-lhe professores de francês, de música, de desenho; entregaram-lhe enfiadas de romances banais e livros de maus versos; e, todavia, não lhe deram moral, nem trataram de lhe formar o caráter. A desgraçada percorreu bailes desde pequena; ouviu o primeiro galanteio aos dez anos de idade; teve a primeira paixão aos doze; aos quinze julgava-se desiludida e sonhava com o túmulo; aos vinte, como é natural, sucumbiu ao palavreado de um primo em segundo grau e bacharel pelo Pedro II.

O primo, assim que a viu pejada, azulou para o Rio Grande do Sul, onde tinha a família, e nunca mais lhe deu sinal de si.