Lúcia perdeu os sentidos; esteve à morte. Os pais, envergonhados com o procedimento indigno da filha, tinham-se ido refugiar na cidade de Campos. Foi o tio de Pereira, o tal das riquezas aferrolhadas, quem a salvou; era um velho ainda bem forte e muito mais esperto que o sobrinho. Deu-lhe casa, comida, roupa e dinheiro.

Uma irmã dele, senhora de inveterado amor a crianças, solteirona, de quarenta a cinquenta anos e que, com o olho no testamento, desejava a todo o transe ser agradável ao mano, encarregou-se do filho do bacharel.

Correram quatro anos. Lúcia não viu mais a família; apenas visitava o filho, de quando em quando.

Pereira continuava às sopas do tio, indiferentemente, como se tudo aquilo não lhe dissesse respeito. Acordava, quer dizer, levantava-se às dez horas, tomava no quarto o seu banho morno, depois um copo de leite fervido, almoçava às onze, fazia a digestão estendido no sofá da sala; às duas horas dormia, depois passeava pela chácara à espera do jantar, cujo quilo era de rigor ser feito a sono solto em uma rede que ele tinha no quarto.

À noite, quando conseguia levantar-se jogava o gamão com o tio. Cochilavam ambos, até que se servia o chá, e cada um se retirava para a cama.

— A noite fez-se para dormir! Sentenciava um deles.

— E o dia para se descansar, resmungava o outro espreguiçando-se.

E recolhiam-se.

O velho morreu de repente; uma congestão que lhe sobreveio ao encontrar Lúcia no fundo do jardim às voltas com um estudante da vizinhança.

— Bom! dissera Lúcia, alijada afinal daquela obrigação que já lhe ia pesando demais. E fariscou o testamento. Mas o velhaco apenas deixava algumas dívidas à