— Amor é o que sinto por ti, entendes?! Amor é o que me faz esquecer a minha responsabilidade, o meu destino, o meu dever, para estar aqui a teus pés, alheia a tudo, esquecida do passado, descuidosa do futuro; só para te ver, só para te ouvir, só para me saturar toda de tua presença!...

— Entretanto... disse Amâncio, procurando afinar a voz pelo tom enfático com que falava a outra — entretanto, nunca me permitiste fruir contigo os verdadeiros e mais saborosos proveitos do amor! Tiveste a cruel habilidade de transformar um manancial de gozos em fonte perene de tormentos e dissabores! Se me amas, digo-te eu agora, porque evitas a todo transe que eu vá além dos nossos beijos?... Se me amas, por que impões o suplício do teu rigor? Ah! eu só acreditaria na sinceridade de tais protestos se fosses mais generosa comigo...

— Não! não! contrapôs ela, abraçando-o. — Nunca faltarei aos meu deveres! nunca trairei meu marido! Sou capaz de uma loucura; não, porém, de uma infâmia! Seria capaz de fugir contigo, abandonar tudo por tua causa; mas introduzir-te covardemente na minha alcova, nunca! Aceitaria um crime, sim! mas havia de aceitá-lo sob todas as responsabilidades, com todas as conseqüências, que ele viesse a produzir! Seria tua, mas não enganando a outro; seria tua, mas toda, inteira, lealmente! Abandonaria por tua causa meu marido; antes, porém, de o fazer, dir-lhe-ia com franqueza: "Fulano! Amo um outro! Não posso continuar ao teu lado, sem que te engane todos os dias e a todos os instantes! Por isso — vou! Amaldiçoa-me, se quiseres, mas não perturbes a minha felicidade!" Deixaria de ser esposa, para ser concubina! Trocaria meu nome, minha posição, por algumas horas de delírio, por algumas