se lentamente para o segundo andar, em busca da mulher.
Não a acusou; não lhe fez de leve uma pergunta de desconfiança; apenas disse, pondo-lhe a carta defronte dos olhos:
— Mira-te neste espelho!
Hortênsia ficou lívida.
— Vê tu em que eu me metia!... acrescentou ele. — Defender aquele miserável! Calculo quanto não te incomodaste, minha santa!
E beijou-a na testa.
Ela sacudiu os ombros numa expressão de confiança na própria virtude: — O marido a conhecia bem, para que pudesse recear uma deslealdade de sua parte!
Logo, porém, que lhe escapou da presença, sentiu uma grande vontade de chorar. Correu ao quarto, fechou-se por dentro, e atirou-se à cama, abafando os soluços com os travesseiros que se inundavam.
Era um desespero nervoso, uma estranha mágoa por alguma coisa que ela podia determinar o que fosse, mas que só se abrandava com aquela orgia de lágrimas. Sentia gosto em vertê-las, abundantes, fartas, como se as derramasse no fogo que a devorava.
Não obstante, ao receber aquela carta, ainda lhe sobejara coragem para responder, sem afrouxar nos seus princípios de honestidade; mais, agora, uma súbita transformação ganhava-lhe os sentidos e parecia chamar-lhe à cabeça as ondas quentes de seu sangue revolucionado.
— E quem não se revoltaria, pensava Hortênsia — defronte da sorte tão contrária do lastimável moço, cujo grande crime consistia apenas no muito amor que ela lhe inspirara?...