mesmo mortas vivem todas na minha memória como se estivessem ali, por trás do paravento; como artista nunca me foi possível ter a impressão do extinto diante de uma estátua grega, a ouvir um trecho de musica clássica, a ver uma linda tela antiga.
Houve um prudente silêncio, e todos olhavam prudentemente as janelas, quando o barão Belfort, que tocava um pouco distante um vago Schumann num piano meio desafinado por falta de uso, exclamou:
— Como tem você razão! Os grandes sentimentos e as grandes emoções são sempre os mesmos. Por isso, os homens guardam na história o mesmo fenômeno de memória da sua vida interna, lembram-se mais de fatos do tempo de infância do que do tempo de ontem. Como artistas, neste torvelinho moderno em que a beleza desapareceu, só o que é medíocre, muito medíocre, dá a sensação do passado, mesmo que seja de ontem. Diante da Vitória de Samotrácia no Louvre é impossível deixar de ter o enebriamento do triunfo diante daquele bloco de pedra ardente que parece arrastar as embaterias da conquista, e anima os nossos nervos de hoje como animaria os dos helenos. A vista da delicadeza pré-angelical de uma cabeça de Murilo, o nosso amor pela beleza vibra como vibrava o dos contemporâneos do grande artista. Que digo! Diante dos simples pedaços de pedra apanhados nas escavações do Egito nós sentimos a vida porque eles sabiam reproduzir