foi? disse espreguiçando sobre mim o lânguido olhar.
Voltei o rosto sem responder-lhe. Eu começava a sentir uma espécie de pavor dessa menina. Havia nela a inspiração heróica e a tentação satânica que o gênio do bem ou do mal derrama sobre a humanidade pela transfusão da mulher. Em outra cena mais larga eu a julgaria capaz de vibrar o punhal de Judite ou de Macbeth.
Desde esse dia quando ela se aproxima de mim, ou mesmo de longe me envolve com seu olhar maléfico, a minha coragem vacila. A raiva que sinto de mim mesmo reflui sobre ela. Cubro-me então com o motejo ofensivo e grosseiro. Que queres, Paulo? É a coragem do desespero.
Mas ela, a incompreensível criatura, longe de ofender-se, parece deleitar-se com as explosões do meu desprezo e ressentimento.
Ainda ontem.
Conversávamos indiferentemente, quando veio a falar-se de uma moça, que amava seu primo a quem estava prometida, e de repente se casara com o filho de um rico capitalista. Já sabes; a noiva era acremente censurada; eu tomei sua defesa contra Julinha.
— Pois eu desculpo essa moça, D. Julinha: seu amor tinha talvez a coragem da morte, mas não tinha a coragem da pobreza. Há naturezas assim: os grandes sacrifícios as exaltam, os pequenos as humilham. Eu não a desculparia se ela fosse rica, e em vez de sentir o orgulho de inspirar um amor capaz de resistir a essa sedução do dinheiro, se contentasse