— O senhor defende seu amigo com tanto calor que me faz desconfiar da justiça da causa, doutor, disse Amália a sorrir.

— A crítica é espirituosa, minha senhora, e eu já a tinha lido em seus lábios antes que eles a proferissem. Mas eu quero a este amigo como a um irmão; e dói-me profundamente essa suspeita de loucura, que alguns malévolos se incumbiram de espalhar. Felizmente Carlos restabeleceu-se; aquela impassibilidade que me assustava dissipou-se como por encanto.

— Em Paris? perguntou Borges com ar de dúvida, apenas de leve dissimulado pela cortesia.

— Em Paris, numa visita que fizemos ao Louvre. Carlos sempre teve gosto e inclinação para as artes; lembrei-me um dia de mostrar-lhe o museu de pintura e escultura. Deixei-o um instante para falar a alguém que encontrara na sala; quando o procurei fui achá-lo diante de um quadro, creio que a Ester ou a Suzana do Veronese. Voltou-se; já não era o homem absorto e sombrio que ali entrara: tinha no semblante e em toda a sua pessoa a expressão afável dos mais belos dias de sua vida. Vi em seu olhar uma interrogação e pensando que ela se referia à tela, improvisei admiração, que não sentia, pois, surpreso e contente daquela transfiguração, eu