NOTAS AO LIVRO V.


1-15. — 1-15. — Medium iter he a róta feita ao largo da praia africana. Para se estar ao largo não he forçoso têr perdido a terra de vista, como cuidava Desfontaines: parece que os maritimos se consideram ao largo desde que podem manobrar em todo o sentido, quer ainda se enxergue a terra, quer já tenha desapparecido. — Aquilone he tomado na accepção propria de vento norte, e não por qualquer vento, como julga La Rue: partiram com o máo que soprava, por executarem as ordens celestes; e, sendo escasso, foram orçando o mais possivel, ajudando-se dos remos, até que, surgindo um bravo oeste, Palinuro propoz a Enéas arribar ás praias de Eryx junto ao Lilybeu ou capo di Marsella; o que approvou o chefe, não só pela necessidade, como para suffragar as cinzas de Anchises. Com que arte sabe tecer o poeta os episodios na sua fábula! — Colligere arma não he enrizar as vélas como quer Servio, porque arma comprehende mastreamento, velame, apparelhos, todo o necessario á navegação; colligere arma he desempachar o navio de quanto possa dar péga ao vento, desafogal-o para melhor se manobrar. Tendo Palinuro de pedir licença a Enéas para arribar, da qual devera estar certo pela confiança que lhe inspirava, enrizar as vélas, operação longa e difficil, para ao depois desfazer os rizes quando obtivesse a licença, fôra perder tempo e trabalho. Veja-se o Virgilius nauticus, de pag. 49-53, e de pag. 105-106.

28-33. — 28-33. — Flecte viam velis he o que em phrase maritima se chama virar pelo redondo. Com demasiado vento, vira-se dando uma grande vólta e correndo muitos rumos, até chegar ao que se quer; operação mais segura, bem que faça perder caminho. — O Zephyro, ou oeste, que ha pouco era contrário, mudado o rumo, tornou-se favoravel; mas eram grossos os mares, e mais o pareciam a quem então navegava em pôpa. Todas estas miudezas provam com quanta razão nomêa Mr. Jal a Virgilio o poeta marinheiro. Os criticos e commentadores que, sem conhecerem da materia, se mettem a emendar o autor ácêrca da escolha dos ventos e de outras particularidades, bem se podem appellidar de agua doce, como se diz dos máos versificadores.

36-38. — 36-38. — A respeito de Acestes, dos ursos na Lybia, da exactidão deste lugar, vejam-se as notas de Mr. Villenave; que he mais feliz quando defende, que quando censura o poeta. Com Buffon prova-se que ha ursos na Africa, mas não dos negros.