mais memoravel do espirito humano. E o que he um estilo que tem todo o brilho da côrte de um rei?»
Toca-me agora confutar a idéa de que Tasso não se devia servir do maravilhoso a respeito da casa d'Est. Cada um busca celebrar as cousas do seu paiz, e ainda que ellas pareçam aos estrangeiros pequenas, sam grandes aos olhos dos nacionaes: ora Tasso Italiano, em vez de cantar um principe e uma casa real da sua terra, não devia, como patriota, omittil-a para cantar, por exemplo, a casa de França. Delille, não contente de afrancezar a antiguidade na sua paraphrase da Eneida, ainda folgava de que o Tasso tivesse estrangeirado a sua Jerusalem; ou que tivesse posto de parte um meio que lhe subministrou Virgilio, e com que elle ornou o seu poema, em comparação do qual a Henriada, cumpre confessar, não tem sobejo valor. — Se todavia a pequenez da casa d'Est excusa um tanto o máo juizo do crítico, a apreciação dos Lusiadas he miserabillissima. A epoca de que trata Camões principalmente (digo principalmente, porque elle canta e celebra toda a glória portugueza) he por certo a mais importante na história da navegação, vale mais do que o seculo de Luiz XIV: o descobrimento da nova róta das Indias por Vasco da Gama, unido ao da America por Colombo e á do Brazil por Cabral, mudou a face do mundo, ao commercio deu uma extensão prodigiosa, e augmentou os gozos da vida por toda parte; fez cahir nações, levantou outras; he o acontecimento que marca os tempos modernos. Quanto a ser a glória portugueza de pouca duração, distingo: se Delille chama glória só a conquista das Indias e de outros paizes, he exacto que pouco depois a nação portugueza cahiu pelo dominio hespanhol; mas se a palavra comprehende, como deve comprehender, a honra que resulta de todas as suas façanhas, essa glória portugueza, longe de ser de curta duração, já durava seis seculos não interrompidos quando a cantou o seu immortal poeta. A história de França não apresentava uma tam longa serie de successos gloriosos até áquella epoca. — Insisto nesta digressão, porque não he só Delille, he moda, sôbre tudo seguida pelos franchinotes viajantes, menosprezarem a nossa raça, tanto a da Europa como a da America. Uma nação, da qual nasceu a brazileira, hoje com sete milhões de habitantes, sendo a terceira em população na America e a segunda em importancia política, tem a sua glória indelevelmente escrita nos annaes do mundo; alêm de que ninguem pode abrir um mappa do nosso globo, sem nelle encontrar muitos nomes de paizes d'Africa e Asia attestando a parte que o pequeno reino do occidente da Europa tem tido no movimento geral da civilisação. He pena que Delille nos não marcasse as leguas quadradas, a população e os annos de celebridade que deve ter qualquer nação, para poder cantar um poeta os seus feitos heroicos. Camões da mesma pequenez do seu paiz tirou motivo para o louvar na sua magnífica oitava XIV