Do flagicio infernal do mundo ingrato,
Que pungem n’alma, qu’o peito ralam!
— Ah! que doce viver então vivi! —
De pesares immune, julgava ainda,
Descrendo das perfidias embusteiras,
Que as negras páginas do Livro eterno
Marcavam em lettras d’oiro a minha vida
Só fagueiro porvir se me antolhando!
— Pávido sonho! —
E um dia, em que pensava ainda fruir
Esses gosos da vida tão do céu,
Qu’extasiavam de prazer minh’alma,
Um rosto eu vi, qual outro igual não vira,
De mimos, e d’encantos primorosos,
Que ferindo minh’alma, cri julgei,
Bem louco na verdade — se um Anjo! —
Ereis vós, sim Senhora, em quem meus olhos
Ávidos do prazer d’então gosar
Do brilho que nos vossos scintillava,
Sorveram longos tragos desse encanto,
Arroubo dos sentidos, — doce enlevo,
Mago transporte que nascer fizestes
Ao Trovador ingenuo, inexp’riente!
— Do extasis em qu’absorto contemplava
Os olhos vossos, vossa tez mimosa,
Com vôo d’anjo, em amôr tornou-se
O que até então era só culto! —
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