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Se eu pudesse ser puro! Se eu pudesse,
Depois de embebedado deste vinho,
Sahir da vida puro como o arminho
Que os cabellos dos velhos embranquece!

Porque cumpri o universal dictame!?
Pois se eu sabia onde morava o Vicio,
Porque não evitei o precipicio
Estrangulando minha carne infame?!

Até que dia o entoxicado aroma
Das paixões torpes sorverei contente?
E os dias correrão eternamente?!
E eu nunca sahirei desta Sodoma?!

Á proporção que a minha insomnia augmenta
Hieroglyphos e esphinges interrogo.
Mas, triumphalmente, nos ceus altos, logo
Toda a alvorada esplendida se ostenta.

Vagueio pela Noute decahida.
No espaço a luz de Aldebaran e de Argus
Vai projectando sobre os campos largos
O derradeiro phosphoro da Vida.

O Sol, equilibrando-se na esphera,
Restitue-me a pureza da hematose
E então uma interior metamorphose
Nas minhas arcas cerebraes se opera.

O odor da margarida e da begonia
Subitamente me penetra o olfato.
Aqui, neste silencio e neste matto,
Respira com vontade a alma camponia!