Que vivendo no pó, delle nutrido,
Do caminhante o pé mata e soterra.
Pois não é pó o que nestas paredes
Em tantas prateleiras me suffoca?
O lixo que nest'antro carunchoso
Cheio de mil velorios, me comprime?
Hei d'aqui eu achar o que me falta?
Hei de talvez ir lêr em mil volumes -
Que em toda a parte os homens padeceram,
Que aqui e alli, houve um feliz entr'elles?
Com teu rir descarnado tu, caveira,
Que me dizes senão, que em outro tempo,
Como o meu delirou teú pobre cerebro,
A luz do dia procurou, com vasto
Desejo de verdade, e vagou triste
Em deprimente, lugubre crepusculo!
Com essas molas, rodas, alavancas
Escarneceis de mim, vós instrumentos.
Ante as portas estive a que devieis
Servir de chaves; ingenhoso é certo
O mechanismo vosso, mas correl-o,
O pesado ferrolho, não soubestes.
Amante do mysterio, á luz do dia
Não deixa despojar-se a natureza
Do seu escuro veu, e o que ao espirito
Não quizer revelar-te, nem com helices
Lh'o arrebatas, ném com alavancas.