diversas causas de excitamento popular contra os christãos-novos obravam, por isso, aqui com maior violencia, até porque a vigilancia dos magistrados e tribunaes superiores obstava melhor na corte aos excessos do odio e, obrigando-o a reconcentrar-se sem o destruir, dava-lhe novas forças. Como os vulcões, ora dormentes, depois murmurando com fugitivos abalos respiram apenas por uma ou por outra fenda as materias vulcanicas e, a final, rebentando em erupção violenta, lançam em turbilhões a lava e o fumo por todo o âmbito da negra cratera, assim a má vontade do vulgacho, silenciosa a principio, começou a manifestar-se na injuria e, recalcada, veio a rebentar em scenas de atrocidade. Os symptomas da futura erupção começavam. No dia de Pentecostes (25 de maio de 1504) alguns conversos achavam-se na rua nova, então a principal de Lisboa, quando subitamente se viram rodeiados de uma turba de rapazes, nenhum dos quaes passava de 15 annos. Do meio dessa turba começaram a chover sobre elles as affrontas e os motejos. Menos paciente, um dos injuriados tirou da espada e feriu cinco ou seis dos aggressores. Suscitou-se um tumulto, mas, acudindo o governador da justiça com os seus officiaes, pôde atalhar o incendio.