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MONTEIRO LOBATO

do aparelho. Todos o observavam com a maior atenção. Segundos depois o Visconde começou a sorrir, num verdadeiro enlevo d'alma. Era o sorriso de todos os grandes inventores — o de Édison, quando viu acender-se a sua primeira lâmpada — o de Alexandre Bell, quando ouviu a primeira palavra ao telefone...

— Está ótima a minha máquina! — disse ele. — Ouço perfeitamente os pensamentos desta taturana. Ouço é modo de dizer, porque não há som. Percebo os pensamentos dela.

— Capta! — ajudou Pedrinho.

— Sim. Estou captando tudo o que ela pensa neste momento.

— E que é? — quis saber Emília.

— Ela está, como se diz, "filosofando" — respondeu o Visconde e tão interessante me parece a sua filosofia que era bom que Pedrinho tomasse nota num papel do que eu for dizendo. Veja papel, Pedrinho, e lápis.

Pedrinho foi correndo buscar papel e lápis e de volta já não encontrou o Visconde no aparelho, e sim Emília, que o alijara dali à força. Quis encrencar, mas Narizinho fez "Psiu! Escreva". E ele vendo a atenção de todos, escreveu o que Emília falou.

— Parece que lhe aconteceu qualquer coisa — disse Emília, porque esta taturana está triste e volta e meia dá um suspirinho. Vou repetir com a maior exatidão o que ela está pensando. Escreva, Pedrinho — e ditou os pensamentos da taturana.

— "Ah, bem triste a minha vida! Num mundo de coisas tão lindas, eu sou feia e inspiro repugnância. Num mundo tão cheio de asas, eu ando me arrastando pelo chão e pelas cascas das árvores. Quem me dera ser como as borboletas que vivem pairando no ar!"

Emília interrompeu o ditado para dizer:

— Como é burrinha! Não sabe que as borboletas saem das lagartas, de modo que uma lagarta é uma futura borboleta, como uma borboleta é uma passada lagarta.

— Nada mais verdade — disse Dona Benta — mas como é que ela há de saber? As taturanas ou lagartas conservam-se