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MONTEIRO LOBATO

coisa falsa por verdadeira. E que para evitar isso havia a palavra Fac-Símile, destinada a ser impressa em tudo quanto fosse cópia de um original. Se eu duplico um objeto e marco a cópia com essas palavras, posso vendê-la sem nenhuma dor de consciência, porque não estarei enganando ninguém. Se Emília entregasse à deusa Flora uma cópia do Visconde marcada com a palavra Fac-Símile, ela não estaria enganando a deusa e Dona Benta nada poderia dizer.

E Emília escreveu em letra de forma nas costas do Visconde falso: Fac-Símile; mas pintou uma coroinha em cima. Aí é que revelou a sua malícia. A coroinha era de Visconde, de modo que a palavra "Fac-Símile" deixou de significar "Cópia" e passou a significar um nome próprio: o Visconde de Fac-Símile... Por ter sido boneca, Emília considerava-se no direito de enganar aos outros, coisa que Pedrinho e Narizinho jamais fizeram.

Pronto o novo Visconde, tinha de levá-lo ao reino da deusa Flora e como era?

O pó de pirlimpimpim resolveu o problema — e na manhã do dia seguinte Emília cheirou uma pitada e deu outra ao falso Visconde, e os dois foram acordar nos domínios da deusa.

Que maravilha! O reino estava acordando. As flores ainda orvalhadas entreabriam suas pétalas para o sol. As abelhas começavam a sair das colmeias. Os passarinhos experimentavam as asas. As teias de aranha, com os fios recamados de gotinhas de orvalho, tornavam-se invisíveis com a evaporação. O ar estava impregnado de perfumes fresquinhos.

Emília despertou ao pé do trono da deusa, com o novo Visconde no braço. Flora desceu para recebê-los.

— Estou reconhecendo a figurinha que aqui esteve ontem e combinou comigo um negócio. Julguei que houvesse esquecido...

— Não me esqueci, não! — respondeu Emília, já perfeitamente boa da tontura do Pim. — Combinamos a troca de seis ninfas pelo Visconde de Sabugosa, e aqui o trago, mas com o nome mudado. Chama-se agora Visconde Fac-Símile.

— Por que mudou? — quis saber a deusa.