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MONTEIRO LOBATO

seus poemas e os sábios lançam a sua ciência. Sou a produtora duma substância mágica, a celulose, que os homens transformam em seda na paz e em explosivos na guerra. Também de mim se faz a matéria plástica com que se constroem os mais rápidos aviões e mil peças da civilização. Do alcatrão extraído do meu lenho saem os mais reluzentes vernizes — esses vernizes espelhantes que brilham nos automóveis. E ainda produzo um álcool que serve de substituto da gasolina para acionar esses maravilhosos veículos. Sou riqueza e poder..."

Panchito estava surpreso. Nunca supôs que da madeira das árvores pudesse sair tanta coisa. Seus olhos não se despregavam daquela grande massa de galhos e folhas que cobria de sombra as palavras de Sarmiento. Ele olhava para a velha árvore como para um milagre vivo e silencioso.

— Guarde as palavras de Sarmiento, meu filho. O melhor bronze para fixá-las não é o metálico, e sim, justamente, a memória fresca dum menino esse bronze vivo. E nunca mais faça a uma árvore o que fez hoje àquela pobre macieirazinha lá de casa.

Panchito, apanhado de surpresa, corou vivamente. Mas defendeu-se.

— É que eu não sabia, papai. E o que fiz foi apenas arrancar uma parte da casca.

— Apenas? Não sabe então que é pela casca que as árvores vivem? Que é por dentro da casca que correm os canaizinhos por onde a seiva bebida no solo as alimenta? A nossa macieira descascada não crescerá — secará — breve estará miúda reduzida a lenha. Se este grande gomero nos está dando sombra é porque nenhum menino lhe arrancou a casca quando novo.

Panchito ouvia com os olhos muito abertos e o olhar distante. Fizera aquilo porque não sabia. Seu pai não insistiu no caso. Desviou a conversa.

— Esta árvore viu muita coisa em sua vida — disse ele. — Viu grandes cantores que subiram aquelas escadas ali do Colón para arrebatar o público com a magia de sua voz. Viu Maria Barrientos descê-las depois do espetáculo, ainda tonta com os