Miguel José continuava a mastigar sua cebola com pão, enquanto Manuel da Silva contava a féria. Contada que ela foi, disse bem alto:

- Pela hora que é, as cousas não vão mal. Até o meio-dia vendo tudo...

Guardou o dinheiro na bolsa que tinha a tiracolo e perguntou subitamente ao companheiro de acaso:

- Você já vendeu muito hoje, patrício?

- Nada, sinhor.

- Está você a dar com o tal de senhor! Pergunto se você já vendeu alguma cousa hoje, homem!

- Nada.

- O que é que você vende?

- Santo, sinhor.

- Santo?

- Sim; santo.

- Deixa ver isto, como é? fez o português curioso.

O armênio passou-lhe os registros coloridos e o vendedor de sardinhas pôs-se a olhá-los com espanto e deslumbramento artístico de aldeão simplório. Achou tudo aquilo bonito: aquele Jesus, mostrando o coração; são João, com o carneirinho; o Menino Jesus - tudo muito lindo aos seus olhos maravilhados de camponês cândido e enfeitiçado pelas cousas do senhor vigário.

Refletiu de si para si: "Cousas tão bonitas, se não as vendeu, é porque este 'turco' é mesmo burro. Comigo, já as tinha vendido, ganhado dinheiro e ficado com algumas, pra pôr lá no quarto".

Veio-lhe uma idéia.

- Patrício! Você quer fazer um negócio?

Os olhos de carneiro do armênio luziram mais forte e com mais esperança.

- Qual é? perguntou ele.

- Tenho ali na cesta cerca de vinte mil-réis de sardinhas, vendidas a duas por um vintém. Se você vendê-las a vinte, ganha o dobro. Quer você trocar estes santos pelo cesto de