papel. No que estou pensando, e se acharei até lá meios de cumprir a palavra.

—Se lhe pagarem como devem, com certeza. Em todo o caso aperte um pouco com os doentes.

—Não imagina, replicou Cirino com verdadeiro sentimento, quanto me tem amofinado essa maldita dívida. Não pelo dinheiro, que dele faço pouco caso; mas por ter pegado em cartas, coisa que nunca tinha feito na minha vida; isto sim...

—Pois meu rico senhor, prosseguiu Pereira, sirva-lhe esta de lição e tome tento com a gente do sertão, não com esses que moram -nas suas casas, sossegados e amigos de servir, mas com viajantes, homens de tropas e carreiros. Isso sim, é uma súcia de jogadores, que andam armados de baralhos e vísporas e, por dá cá aquela palha, empurram uma faca na barriga de um cristão ou descarregam uma garrucha na cabeça de um companheiro, como se fosse em melancia podre. Depois, o demônio do jogo, quando entra no corpo de um desgraçado, faz logo ninho e de lá pincha fora a vergonha. Da má vida com raparigas airadas, fadistas e mulheres à toa, ainda a gente endireita; mas com cartas e sortes, só na caldeira de Pedro Botelho é que se cuida em mudar de rumo. Quem lhe fala, teve um tio morador nas Trairás, para cá de Camapuã cinco léguas, que trabalhava todo o ano na terra para vir jogar até perder o último cobre nas rancharias do Sucuriú.

Pereira, de posse de tão largo assunto, contou mil historias, umas lúgubres, outras jocosas, verídicas, inventadas na ocasião ou reproduzidas.

Haviam, no entretanto, os dois caminhado bastante. Inclinara-se no horizonte