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JORNAL DAS FAMILIAS.

— Deixe lá o barbeiro... Quer que lhe diga? Eu creio que, mais dia menos dia, ele está fisgado.... Já está. Há aí umas coisas que ouvi dizer na missa de domingo passado...

— Que foi?

— Umas coisas...

— Diga.

— Não digo. O que for aparecerá. Talvez tenhamos casamento mais breve do que pensa.

— Sim?

A sra. Leonarda fez um gesto de cabeça. O sr. Bento Fagundes esteve algum tempo a olhar as paredes; depois prorrompeu irado:

— Mas, tanto pior! Ele não está em posição de casar. Salvo se a sujeita...

E o orador concluía a frase esfregando o polegar no indicador, gesto que a sra. D. Leonarda correspondeu com outro derreando os cantos da boca, e abanando a cabeça da direita para a esquerda.

— Pobre! traduziu o sr. Bento Fagundes. Olhe, se ele pensa que há de vir meter-me a mulher em casa, está muito enganado. Eu não fiz cinqüenta e quatro anos para sustentar família nova. Talvez ele pense que eu tenha mundos e fundos

— Mundos, não digo, primo; mas fundos...

— Fundos! os das gavetas.

Aqui o sr. Bento Fagundes ia esfriando e desconversando, e a sra. D. Leonarda traçava o xale e despedia-se.

II.

Bento Fagundes da Purificação era boticário, na Rua da Saúde, desde antes de 1830. Em 1852, data do conto, tinha ele vinte e três anos de botica e um pecúlio, em que todos acreditavam, posto ninguém dissesse tê-lo visto. Aparentemente havia dois escravos, comprados no Valongo, quando esses eram ainda boçais e a preço módico.

Vivia o sr. Bento Fagundes uma vida monótona e aborrecida como a chuva miúda. Raro saía da botica. Nos domingos havia um vizinho que o ia entreter ao gamão, jogo em que ele era emérito, porque era inalterável contra as pirraças da sorte, vantagem contra o adversário, que era irritadiço e frenético. Felizmente para as botijas do sr. Bento Fagundes, as coisas não se passavam como no soneto de Tolentino; o parceiro não