lhe o braço ao redor do pescoço, e apertando a face incendiada aquelle rosto de anjo, que dissimulava um coração de demonio.

Os dous tenues reflexos da lua tinham esmorecido nos olhos de D. Fernando: o halito de Leonor Telles queimára as lagrymas da compaixão e do remorso.

“Enganas-me, ou enganas-te a ti proprio, Fernando!—­replicou a rainha.—­Tu és infeliz, e eu sei porque o és. Aborreces já a pobre Leonor Telles.”

O tom com que estas palavras foram proferidas era capaz de partir um coração de marmore.

“Enlouqueceste, Leonor?—­exclamou el-rei.—­Aborrecer-te? Sem ti este mundo fôra para mim um ermo, a corôa martyrio, a vida maldicção de Deus. Como nos primeiros dias dos nossos amores, no leito da morte amar-te-hei ainda. Gloria, riqueza, poderio, tudo te sacrifiquei: não me pêsa. Mil vezes que tu o queiras t’o sacrificarei de novo.”

“Oh, prouvera a Deus que o teu amor fosse metade do que dizes: fosse metade do meu!”

“Busca, inventa, aponta-me algum modo de te provar o que digo, e verás se as minhas palavras são sinceras!”

“Ha um, rei de Portugal!”—­replicou Leonor