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porque eles têm força, porque os seus músculos, os seus nervos, o seu cérebro ainda têm vigor para muitos anos, para muito tempo, e os anos e os tempos mudam as circunstâncias, matam inimigos, fazem surgir amigos novos, fazem aparecer outros merecimentos, criam novas recomendações, restabelecem o império da justiça, que é a lei em virtude da qual cada um deve adquirir aquilo que vale?

D. Damiana era um poço de desgostos. De uma alta representação na vila onde nascera, caiu na planície da pobreza, afundou-se na obscuridade. Às sedas e aos brilhantes substituíram-se-lhe jóias e roupas da viuvez. Os sorrisos que soíam entreabrir-lhe os lábios, quando, para comemorar datas distintas se reunia em sua casa a primeira nobreza no lugar, haviam desaparecido sob lágrimas silenciosas e longas, que lhe desciam agora pelas faces cobertas de mortal palidez. É fácil imaginar o desgosto que lhe acarretara a súbita transformação.

Mas uma jóia, um tesouro, havia ficado com ela. Por não lho poder arrebatar a morte do marido, a ausência dos parentes, as injúrias da plebe amotinada e capitaneada pelos inimigos da nobreza, o seqüestro, a rápida mudança de uma existência talvez de fausto para uma existência que estava ao nível das que sustenta a caridade particular; essa jóia, esse tesouro, eram os seus vinte e três anos; era a musculatura nova; eram a s carnes rijas, o sangue puro, o