Meio-dia a dar no sino das torres, e eu entrando em casa de Lúcia.
Tinha refletido: essa amizade não podia continuar; se havia de desatar mais tarde, depois de me ter feito curtir mil dissabores, bom era que cessasse desde logo. Não julgue porém que estava resolvido a separar-me por uma vez de Lúcia; minha coragem não chegava a tanto. O que eu desejava era demitir de mim um titulo que me esmagava na minha pobreza, o titulo de amante exclusivo da mais elegante e mais bonita cortesã do Rio de Janeiro.
Ela recebeu-me com brandura. Tinha os olhos rubros e pisados de lágrimas; apertando minha mão, beijou-a Que pretendia ela exprimir com esse movimento! Seria a imagem viva da humilde fidelidade do cão, afagando a mão que o acaba de castigar?
Estivemos muito tempo sem trocar palavra.
Enfim Lúcia fez um esforço, sorriu como se nada houvesse passado, e veio sentar-se nos meus joelhos, acariciando-me com a ternura e a graciosa volubilidade que ela tinha quando o júbilo lhe transbordava d'alma. Aproveitei o momento para alijar o peso que desde a véspera me acabrunhava.
— Sabes que eu não sou rico, Lúcia!
Seu olhar luminoso penetrou-me ate os seios d'alma para arrancar o pensamento que inspirava essas palavras; respondeu com um pálido sorriso:
— Pensava ao contrário que era muito rico!
Pois pensaste mal. Sou pobre, e não posso sustentar o luxo de uma mulher como tu.
— Acha pouco o que me tem dado!