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E a Pastôra, já mais acostumada
Á estranha maravilha, a si voltou.
E d'esta fórma, olhae, um tal milagre
N'uma cousa vulgar se transformou;
Porque todo o milagre ou maravilha
Deixa de o ser, apenas se demora
Deante da nossa vista, como as arvores,
O mar, a nevoa, a flôr, a luz da aurora.
E por isso, mais calma, erguendo os olhos
De mortal e vivente para aquela
Imagem imortal, assim lhe disse:
(Pois tão heroica é a Virgem e a Donzela!)


«Sim; tu és o Demonio que persegue
E vae pisando a sombra caminhante
D'este homem que delira e tem na fronte
O destino que o faz andar errante!


«N'este sitio sósinho, onde apascento
Meu rebanho, meus olhos ... e onde. á tarde,
Vem conversar comigo a voz do vento
E onde esta clara fonte me sorri;
Encontrei-o, de joelhos, sobre a terra,
Dizendo cousas vagas, sem sentido.
Logo vi que d'um genio ou mau espirito
Ele andava, no mundo, perseguido!
Mas ao pousar os olhos no meu rosto,
O juizo lhe tornou; e então me disse
Palavras que serão o eterno gôsto
D'esta alma de mulher que Deus me deu!
E tu, Phantasma, vens tirar-lhe a paz,

Perturbá-lo e perdê-lo! Para que