— Ora, disse afinal D. Maria com ar de quem não estava muito certa do que dizia, ele estava descuidado, não foi por querer...
O menino foi sentar-se, e a conversa prosseguiu.
Chegou-se ao ponto do destino que o padrinho queria dar ao afilhado, e, segundo era costume, começou logo grande divergência entre o compadre e a comadre; esta não falava senão na Conceição, e aquele não falava senão em Coimbra.
D. Maria, solicitada a dar a sua opinião, disse:
— Pois olhem, se fosse comigo, eu havia de pô-lo em um cartório, e havia de fazer dele um bom procurador de causas.
— Oh! não, respondeu o compadre; perdoe-me, Sra. D. Maria, perdoe-me se lhe ofendo com isso, mas eu tenho uma birra dos diabos com as tais demandas...
— Pois olhe, não tem razão; elas dão-me que fazer, mas eu já estou acostumada. Por exemplo, aquela demanda das terras, isto tem sido um nunca acabar; os herdeiros do meu compadre João Bernardo, que ainda não estavam habilitados em juízo, mandaram-me aqui citar...
E por aí continuava, sem que ninguém soubesse onde pararia, quando felizmente teve de interromper-se porque a procissão aproximava-se, e todos correram às janelas.
Isto deu fim à conversa, começou a desfilar a procissão, que realmente fazia bonito efeito, sobretudo vista da casa de D. Maria, que era, e tínhamos esquecido esta circunstância, na mesma rua dos Ourives: as luzes das tochas refletidas nos galões das armações das portas e nas tabuletas cheias de ouro e prata em obra, com que os ourives nesse dia costumavam ornar