— Pobre de Cristo! dizia Amaro. Pobre de Cristo! Deus lhe dê uma boa morte!

E voltavam para a sala de jantar onde o cônego Dias, todo enterrado na velha poltrona de chita verde, com as mãos cruzadas sobre o ventre, dizia logo:

— Ora vá um bocadinho de música, pequena!

Amélia ia sentar-se ao piano.

— Ó filha, toca o Adeus! recomendava a S. Joaneira começando a sua meia.

E Amélia, ferindo o teclado:

Ai! adeus! acabaram-se os dias
Que ditoso vivi a teu lado...

A sua voz arrastava-se com melancolia; e Amaro soprando o fumo do cigarro, sentia-se todo enleado num sentimentalismo agradável.

Quando descia para o seu quarto, à noite, ia sempre exaltado. Punha-se então a ler os Cânticos a Jesus, tradução do francês publicada pela sociedade das Escravas de Jesus. É uma obrazinha beata, escrita com um lirismo equívoco, quase torpe — que dá à oração a linguagem da luxúria: Jesus é invocado, reclamado com as sofreguidões balbuciantes de uma concupiscência alucinada: "Oh! vem, amado do meu coração, corpo adorável, minha alma impaciente quer-te! Amo-te com paixão e desespero! Abrasa-me! queima-me! Vem! esmaga-me! possui-me! " E um amor divino, ora grotesco pela intenção, ora obsceno pela materialidade, geme, ruge, declama assim em cem páginas