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Em 25 de maio de 1987[1], a Revista Veja publicou anúncio publicitário de Lloyds Bank PLC que se valia de foto do casal Lampião (Virgulino Ferreira da Silva) e Maria Bonita (Maria Gomes de Oliveira) em meio a seu grupo de cangaceiros. A única filha do casal, Expedita Ferreira Nunes, propôs ação judicial contra o banco para pleitear indenização por violação da imagem de seus pais.

Uma vez que o uso da foto se deu em meados dos anos 1980, ainda vigorava no Brasil a lei de direitos autorais de 1973. Em seu artigo 45, previa a lei 5.988: “também de sessenta anos será o prazo de proteção aos direitos patrimoniais sobre obras cinematográficas, fonográficas, fotográficas, e de arte aplicada, a contar de 1º de janeiro do ano subsequente ao de sua conclusão”.

Observe-se que a lei não determinava, como ocorre hoje, que o prazo se contasse da divulgação da obra, mas sim de sua conclusão. Crucial na questão, portanto, saber quando a imagem de Lampião e Maria Bonita havia sido captada.

Sabe-se que o casamento deles se deu por volta de 1930 e a morte do casal sobreveio em julho de 1938. A fotografia, portanto, deve ter sido feita nesse ínterim. Se assim de fato se deu, seu ingresso no domínio público ocorreria, na melhor das hipóteses, em 1991 — depois, portanto, de seu uso no anúncio publicitário.

Apesar de ter alegado que a foto se encontrava em domínio público, o réu não logrou prová-lo. O STJ não tratou com maior deferência o direito autoral (no caso, parece-nos que estava mesmo dispensado de fazê-lo), acabando por decidir pela violação do direito de imagem, concluindo que “a utilização da imagem da pessoa, com fins econômicos, sem a sua autorização ou do sucessor, constitui locupletamento indevido, a ensejar a devida reparação”.

Se a decisão parece correta do ponto de vista do direito autoral (em razão da proteção que ainda vigorava), que dizer caso se concluísse que, de fato, a obra se encontrava em domínio público? Em outras palavras, como tratar o uso em peça publicitária, com fins comerciais, de imagem de terceiro originalmente inserida em obra em domínio público? A LDA não faz qualquer distinção quanto ao uso que pode ser dado às obras em domínio público. Nesse sentido, uma vez expirados os direitos autorais patrimoniais objeto da exclusividade, pode qualquer pessoa se aproveitar da obra economicamente. Imaginemos, por exemplo, uma fotografia divulgada em 1930. Atualmente, ela se encontra em domínio público. Pode ser usada em livros ou outras obras artísticas (vídeos, encarte de CD), pode ser editada, pode ser inclusive vendida individualmente ou em conjunto

com outras obras fotográficas. E tudo isso sem necessidade de se pedir autorização.

Conforme já demonstramos anteriormente, acreditamos que a regra vale inclusive se na fotografia estiver estampada a imagem de uma pessoa, seja ela pública ou não.

Uma vez que a lei não distingue, entendemos que o uso da referida fotografia hipotética poderia se dar inclusive para fins publicitários. Afinal, não vislumbramos distinção



  1. 62

62 Informação disponível em http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=368&tmp.texto=68407. Acesso em 14 de agosto de 2010.