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conteúdo artístico da obra, precisa contar com limitações em seu exercício, mesmo que haja quem defenda os direitos das empresas de radiodifusão.

Antônio Chaves comenta as razões alegadas em favor das entidades radiodifusoras a partir de considerações tecidas por Marie-Claude Dock: “os organismos de radiodifusão procuram proteger-se contra toda utilização por terceiros de suas emissões, sem autorização, com alegações análogas às invocadas pelos produtores de fonogramas”[1]. E acrescenta, ainda citando a referida autora[2]:

 

Assim como estes últimos retiraram argumentos do fato de que os discos postos em comércio eram destinados ao uso privado, assim também os organismos de radiodifusão consideraram que suas emissões, que exigem a aplicação de capitais consideráveis, bem como um enorme trabalho técnico e artístico, destinam-se aos particulares. Entendem por isso os organismos de radiodifusão ser protegidos contra toda entidade concorrente que reemita suas emissões sem autorização e consequentemente sem pagamento.

 

Ocorre que aplicando-se o previsto tanto na Convenção de Roma quanto na LDA[3] à transmissão de obras em domínio público, teríamos a inaceitável situação de as empresas de radiodifusão poderem impedir a retransmissão, a fixação ou a reprodução das obras por elas veiculadas. Na prática, haveria verdadeira apropriação de obra em domínio público exercida por meio do controle não de sua cópia material, mas sim pelo controle de sua emissão[4].

Finalmente, existe uma questão que perpassa os direitos autorais sem se ater a eles: seria possível o registro de uma obra em domínio público para identificar marca de produto ou serviço[5]? O registro nesse caso não conferiria ao seu titular um direito de exclusividade sobre uma obra que deve poder ser livremente usada por todos? Tal conduta caracterizaria, portanto, o reingresso de obra em domínio público no domínio privado?



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136 CHAVES, Antônio. Direitos Conexos. Cit.; p. 571.

137 CHAVES, Antônio. Direitos Conexos. Cit.; pp. 571-572.

138 O assunto também é tema de um controvertido tratado ainda em discussão no âmbito da OMPI — o Broadcasting Treaty (oficialmente, “Treaty on the Protection of Broadcasting Organizations”). Segundo o texto do tratado, seriam conferidos 50 anos de proteção às emissões de radiodifusão, ainda que se tratasse de obra sobre a qual não há direito autoral, como ocorre, entre outras, com aquelas em domínio público. Texto disponível em http://webca- che.googleusercontent.com/custom?q=cache:-fSp1RK43VwJ:www.wipo.int/edocs/mdocs/copyright/en/sccr_15/ sccr_15_2.doc+SCCR/15/2&cd=2&hl=pt-BR&ct=clnk&client=google-coop-np. Acesso em 04 de setembro de 2010. As críticas, naturalmente, foram muitas. Ver, entre outros, http://www.eff.org/issues/wipo_broadcast_treaty. Acesso em 04 de setembro de 2010.

139 A Convenção de Roma define a emissão de radiodifusão como “a difusão de sons ou de imagens e sons, por meio de ondas radioelétricas, destinadas à recepção pelo público”. Art. 3º, f.

140 Sobre a concomitância de proteção pelo direito marcário e pelo direito autoral, ver MOREIRA, Natali Francine Cinelli. Da Dupla Proteção da Marca pela Propriedade Industrial e pelo Direito de Autor. Revista da ABPI, n. 107; pp. 54 e ss.