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termo usado pela LDA, em seu art. 7º, para identificar as obras protegidas. Entretanto, os textos apontados no inciso IV do art 8º não são passíveis de proteção, o que acarreta uma série de indagações.

Se a lei prevê expressamente que não são objeto de proteção por direitos autorais os textos de tratados, convenções, leis, decretos, regulamentos, decisões judiciais e outros atos oficiais, a norma é bastante vaga e suas fronteiras são nebulosas. Por exemplo, que dizer da tradução de atos normativos estrangeiros ou da tradução, para língua estrangeira, de atos normativos brasileiros? Há direito autoral sobre tais traduções? Além disso, qual o limite da proteção conferida às decisões judiciais? Finalmente, qual o sentido de “demais atos oficiais”? Em síntese, o que se indaga é: obras produzidas ou comissionadas pela administração pública podem ser consideradas em domínio público?[1]

Conforme visto no capítulo anterior, obras criadas pelo governo norte-americano encontram-se em domínio público. O mesmo não acontece, entretanto, com as obras criadas pelos governos canadense ou inglês, já que algumas delas são protegidas pelo instituto do Crown Copyright[2].

No Brasil, a regra geral será a de excluir os atos oficiais da proteção autoral. Ao mencionar a lista exemplificativa composta de textos de tratados, convenções, leis, de-' cretos, regulamentos, decisões judiciais e demais atos oficiais, parece a lei querer abarcar sobretudo obras textuais expedidas em caráter oficial, e não toda e qualquer obra simplesmente elaborada por servidor público no âmbito de sua atuação na administração pública ou por esta encomendada ou subvencionada.

Isso se dá porque mesmo que deficiente do ponto de vista linguístico, o inciso inicia pela referência a texto de tratados e segue com exemplos de obras puramente textuais. Ademais, porque encerra com menção a “atos oficiais” e não a “obras oficiais”.

Indiferente à distinção entre “ato” e “obra” e tomando a segunda pelo primeiro, Bruno Jorge Hammes comenta que “[o]bras oficiais são obras no sentido do direito de autor. Por que não se lhes aplicariam as disposições referentes à lei autoral? A razão e a finalidade seriam o interesse da mais ampla divulgação de tais obras, que sobreporia o bem público aos interesses dos autores”[3].

Bruno Lewicki afirma que “[a] ratio que faz com que a lei afaste expressamente a proteção autoral sobre decisão judicial, é, de fato, a publicidade — mas não como mera consequência, concessão pragmática ao fato de a decisão estar fisicamente contida em



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167 A respeito da eventual proteção, por direitos autorais, de bases de dados públicas, ver: ASCENSÃO, José de Oliveira.

A Reutilização de Documentos do Sector Público. Revista da ABPI, nº 68; p. 34 e ss.

168 A lei canadense, por exemplo, prevê em seu art. 12: “Without prejudice to any rights or privileges of the Crown, where any work is, or has been, prepared or published by or under the direction or control of Her Majesty or any government department, the copyright in the work shall, subject to any agreement with the author, belong to Her Majesty and in that case shall continue for the remainder of the calendar year of the first publication of the work and for a period of fifty years following the end of that calendar year”.

169 HAMMES, Bruno Jorge. O Direito de Propriedade Intelectual. Cit.; p. 104.