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uma vez que não se enquadram na previsão legal. Ainda que sejam obras elaboradas com recursos públicos, não podem, salvo melhor juízo, ser qualificadas como atos oficiais.

Também fora do escopo do art. 8º, IV, estão as traduções de leis, decisões judiciais e demais atos oficiais de línguas estrangeiras para o Português e vice-versa[1]. Nesse sentido, não importa que a obra original estrangeira (uma lei ou uma sentença, por exemplo) esteja fora da proteção por direitos autorais. Esta é a mesma situação da tradução, para o Português, de um romance estrangeiro que se encontre em domínio público. A tradução, uma vez presentes os elementos para proteção, encontrará amparo nos termos da LDA. Não importa quão antigo seja o texto traduzido, conforme foi decidido pela corte de Israel, quanto aos denominados manuscritos do Mar Morto.

Também estarão protegidas por direitos autorais, por conta do disposto no art. 7º, XIII, as coletâneas, compilações ou bases de dados que, por sua seleção, organização ou disposição de seu conteúdo, constituam uma criação original[2].

Percebe-se, neste passo, que a proteção não abarca os dados em si mesmos, mas sim o conjunto de dados. Por isso, podem publicar-se em livro as trinta melhores sentenças de um magistrado, sem a licença dele, ainda que Bruno Jorge Hammes proteste por considerar injusta referida possibilidade[3].

Podemos aplicar quanto às coletâneas as mesmas conclusões a que chegou o Copyright Office norte-americano: para haver proteção, é necessário que a compilação tenha mais do que uns poucos dados. Uma publicação com duas, três ou quatro sentenças dificilmente seria protegida por direitos autorais. Afinal, é elemento indispensável que a organização dos dados cumpra com o requisito da originalidade.


  1. 172
  2. 173
  3. 174

172 Por exemplo, o “Código Civil Brasileiro em Inglês”, de Leslie Rose. Rio de Janeiro: Renovar, 2008.

173 Sobre a originalidade de base de dados, ver: SILVEIRA, Clóvis. Bancos de Dados Originais e Não-Originais. Revista da ABPI, nº 69; pp. 31 e ss.

174 HAMMES, Bruno Jorge. O Direito de Propriedade Intelectual. Cit.; p. 106. Afirma ainda o autor: “[e]m relação ao magistrado, a aplicação desse direito parece problemática. As sentenças podem ser reproduzidas. Quem publica um compêndio de decisões terá um direito autoral autônomo desde que os critérios de seleção representem uma criação intelectual pessoal. Em qualquer tempo pode haver o interesse em divulgar o conteúdo das sentenças. Contudo, seria muita coincidência se as sentenças de um determinado juiz correspondessem exatamente aos critérios de seleção adotados pelo colecionador, a não ser que o critério fosse selecionar as melhores criações de um determinado magistrado para assegurar mercado às custas da celebridade dele. O interesse já não seria a divulgação de decisões judiciais em geral, ou específicas, mas o interesse comercial. Neste caso, aplicar-se-ia, por analogia, o art. 2 bis 3 da Convenção de Berna, assegurando também ao magistrado o direito exclusivo de reunir em compêndio as suas sentenças” (p. 107). Quanto à aplicação por analogia, parece-nos equivocada. A Convenção de Berna, no referido dispositivo, autoriza que os países da União possam estabelecer em suas leis internas as condições em que as conferências, alocuções, sermões e outras obras da mesma natureza, pronunciadas em público, possam ser reproduzidas pela imprensa, transmitidas pelo rádio ou pelo telégrafo, quando tal utilização é justificada pela finalidade da informação a ser atingida. Em todo caso, o autor tem o direito exclusivo de reunir em coleção as suas obras mencionadas anteriormente. Observe-se que, nesta hipótese, a Convenção de Berna confere proteção autoral a essas obras e apenas autoriza que sua proteção seja limitada. Tanto é assim que a LDA conta com dispositivo nesse sentido, no capítulo de limitações aos direitos autorais. Muito diferente é a situação das leis e das sentenças judiciais, expressamente excluídas de proteção por parte da LDA. Por isso, invocar a analogia nos parece no mínimo inadequado.