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entretanto, para o fato de que a licença CC0 automaticamente promove o ingresso da obra licenciada no domínio público de todos os países do mundo, não apenas naquele onde se dá o licenciamento.

Mesmo que eventualmente venha a se considerar que a licença CC0 não pode ser utilizada para licenciar obras no Brasil, em razão de incompatibilidade com os direitos morais previstos na LDA, é importante apontarmos que o texto da própria licença determina que “se qualquer parte da licença for considerada legalmente inválida ou ineficaz de acordo com a lei aplicável, então a licença deverá ser preservada no limite máximo permitido de acordo com a manifestação de vontade do licenciante”[1]. Como os direitos patrimoniais são normalmente aqueles sobre os quais versam as maiores controvérsias

— e quanto à sua disponibilidade parece não haver contestação significativa — ainda que a licença CC0 viesse a ser considerada parcialmente inválida diante do ordenamento jurídico brasileiro, os efeitos decorrentes da disposição dos direitos patrimoniais já nos parecem suficientes para atender tanto a vontade do autor-licenciante quanto a vontade do usuário-licenciado.

Recentemente, em outubro de 2010, o projeto Creative Commons anunciou o lançamento do Creative Commons Mark, ferramenta que permite que trabalhos em domínio público sejam facilmente identificados e encontrados na internet[2]. A iniciativa foi saudada com bastante entusiasmo e a rede Europeana[3], que contém mais de 14 milhões de itens de imagens, textos, arquivos em áudio e em vídeo[4], comunicou a adoção da marca a partir de 2011 para indicar obras em domínio público[5].

A grande vantagem da adoção do Creative Commons Mark é a identificação de obras em domínio público, uma vez que não existe um sistema de registro de obras mundial que possa ser consultado. Naturalmente, o sistema não é infalível, mas sua adoção por grandes museus, galerias e arquivos públicos poderá ser fundamental para dar maior segurança jurídica ao uso de obras culturais por parte de terceiros.


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  3. 207
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205 Tradução livre do autor. No original, lê-se que “[s]hould any part of the Waiver for any reason be judged legally invalid or ineffective under applicable law, then the Waiver shall be preserved to the maximum extent permitted taking into account Affirmer's express Statement of Purpose”. Disponível em http://creativecommons.org/publicdomain/zero/1.0/ legalcode. Acesso em 14 de janeiro de 2010.

206 Disponível em http://creativecommons.org/press-releases/entry/23755. Acesso em 22 de janeiro de 2011.

207 Disponível em http://www.europeana.eu/portal/index.html. Acesso em 22 de janeiro de 2011.

208 Disponível em http://www.europeana.eu/portal/aboutus.html. Acesso em 22 de janeiro de 2011.

209 Disponível em http://creativecommons.org/press-releases/entry/23755. Acesso em 22 de janeiro de 2011. Curiosamente, o guia de uso de obras em domínio público constante do website da Europeana (http://www.europeana.eu/portal/pd-usage-guide.html) solicita a indicação de autoria das obras e de sua origem (por exemplo, o museu onde a obra se encontra), de modo a estimular que cada vez mais obras em domínio públicos se tornem disponíveis online. Além disso, são demandados respeito pela obra, pelo autor, difusão de informações adicionais sobre a obra, manutenção da marca indicativa de domínio público, entre outros itens. Por tudo isso, vê-se que os direitos morais remanescentes pela LDA após o ingresso da obra em domínio público são exatamente aqueles decorrentes, pode-se afirmar, de um uso em conformidade com uma ideia genérica de boa-fé objetiva, ainda que em algumas jurisdições tais direitos (ou alguns deles) sequer sejam exigíveis.