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transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar. Apesar de o texto constitucional não se valer dos mesmos termos da Constituição norte-americana[1], a discussão travada quando do julgamento do caso Eldred vs. Ashcroft poderia ser, quanto a alguns aspectos, retomada no Brasil. Afinal, a CF/88 determina que o direito autoral será vitalício e, com a morte do autor, transmitido aos herdeiros deste pelo tempo que a lei fixar. É necessário que a lei fixe um tempo de proteção aos direitos autorais. Naturalmente, alguém poderia defender que a perpetuidade dos direitos também é um tempo, um prazo fixado pela lei. No entanto, não parece ser essa a intenção da CF/88 ao prever que o tempo seja fixado, fazendo crer que um limite deve ser imposto.

Ademais, a proteção perpétua estaria em conflito com diversos outros direitos, também de ordem constitucional, apontados no primeiro capítulo desta tese, quando tratamos do fundamento jurídico do domínio público. A título de exemplo, lembramos os direitos à educação, à cultura, à livre expressão.

A rigor, podemos dizer que o prazo hoje vigente no Brasil já é suficientemente longo para representar um desequilíbrio nas relações entre autor e sociedade. Parece claro que os frutos econômicos decorrentes da exploração da obra se esgotam, em regra, muito antes de expirado o prazo de proteção. Por outro lado, é praticamente impossível que qualquer pessoa venha a viver tanto tempo a ponto de usar livremente obra de um contemporâneo seu por esta ter ingressado no domínio público. Sob estas duas perspectivas, o prazo de proteção já parece ser demasiado longo.

Em um sistema de direito civil-constitucional, no qual a Constituição Federal exerce papel estruturante e é norte hermenêutico, todo o ordenamento jurídico deve ser compreendido a partir de diretrizes constitucionais. “Atualmente, passou a ser premissa do estudo da Constituição o reconhecimento de sua força normativa, do caráter vinculativo e obrigatório de suas disposições. Vale dizer: as normas constitucionais são dotadas de imperatividade, que é atributo de todas as normas jurídicas, e sua inobservância há de deflagrar os mecanismos próprios de coação, de cumprimento forçado”[2].

Considerando-se que a Constituição deve ser interpretada levando-se em conta princípios como o da supremacia da Constituição, o da unidade, o da razoabilidade e o da efetividade[3],


  1. Que determina, em seu artigo 8, que um dos poderes do Congresso é “promover o progresso da ciência e das artes, assegurando, por tempo limitado, aos autores e inventores, o direito exclusivo a seus escritos e descobertas, ou, no original, “to promote the Progress of Science and useful Arts, by securing for limited Times to Authors and Inventors the exclusive Right to their respective Writings and Discoveries”. Disponível em http://www.usconstitution.net/const.html. Acesso em 18 de janeiro de 2010.
  2. BARROSO, Luís Roberto. A Constitucionalização do Direito e o Direito Civil. Cit.; p. 241.
  3. “Tais princípios, de natureza instrumental, e não material, são pressupostos lógicos, metodológicos ou finalísticos da aplicação das normas constitucionais. São eles, na ordenação que se afigura mais adequada para as circunstâncias brasileiras: o da supremacia da Constituição, o da presunção de constitucionalidade das normas e atos do Poder Público, o da interpretação conforme a Constituição, o da unidade, o da razoabilidade e o da efetividade. Estes