O INFERNO
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«Que condemnação, diz S. Bernardo, a da vontade amarrada á precisão de crêr o mal e não crêr o bem; por tal modo que de qualquer maneira que se mova, é sempre criminosa e miseravelmente! Não ha de gozar jámais os prazeres culpaveis que deseja; e as privações que ella não quer é as que ella ha de ter por toda a eternidade.»

Crêr o mal e não crêr o bem, é logo o resultado d'aquella condemnação. Por sentença do juiz, e de que juiz! é que lá eternamente se anceiam impudicos prazeres, ao mesmo passo que o espirito soffre a privação dos sentidos. Montesquieu, que, a fallar verdade, não era padre da Igreja nem monge, formava outra idêa da natureza moral das penas destinadas a servir de sancção aos accordãos da justiça da terra propriamente. Lêde no Espirito das leis certo capitulo intitulado: Da violação do pudôr, no castigo dos crimes. Assim começa o capitulo: «Ha regras de pudôr observadas em quasi todas as nações do mundo: absurdo seria violal-as no castigo dos crimes, o qual deve sempre ter em vista o restabelecimento da ordem.»

Ainda que Montesquieu m'o não dissesse, a cousa é evidente por si. Satrapas em delirio, Cezares devassos, tyrannos corruptissimos, póde ser que alguma vez enviassem uma rapariga desobediente mas honesta a um bordel, e que, ajuntando calculadamente a indecencia ao castigo, convertessem a excitação dos sentidos em supplicio legal, deshonrando a lei para deshonrar o inimigo. Em todos os paizes civilisados castiga-se