vida. Com efeito Gonçalo tinha a mais viva fé naquela santa imagem, e nunca em dias de sua vida deixou de beijá-la com fervorosa devoção ao deitar-se e ao levantar-se da cama depois de ter rezado uma ave-maria. Assim todas as vezes que se achava em apertos, com uma das mãos apalpava o cinturão, em que trazia o talismã da superstição africana, e com a outra levava aos lábios o relicário, confundindo desta maneira em sua tosca imaginação o culto da mãe de Deus com uma grosseira feitiçaria.

Apesar disso não se passava um só dia em que Gonçalo não fizesse provar a algum pobre cristão a força de seu braço rude e vigoroso. Cabeças e braços quebrados, narizes esmurrados, caras esbofeteadas, costas derreadas, eram façanhas que todos os dias aumentavam a fama e terror de seu nome.

Zombava da justiça, que naquele tempo e naquelas paragens parece que nenhuma força tinha.

Gonçalo muitas vezes dispersou e espancou as milícias encarregadas de prendê-lo por ocasião de alguma das suas falcatruas.

Ele as espalhava a pontapés, como quem arreda com a ponta do pé um tropeço que encontra em seu caminho.

Demais, Gonçalo tinha por si grande número de parceiros, vadios e bandidos como ele, que o temiam e respeitavam, e com os quais contava em ocasião