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CCXLIV.

Aos homens hum só homem poz espanto,
E o poz a toda a humana natureza;
Que de homem teve o ser, de Anjo a pureza,
Porqu'antes que nascesse era ja Santo.

Propheta foi na Mãe; em fim, foi tanto,
Qu'entre os nascidos houve a mor alteza;
Que da Luz, sem a ver, vio a grandeza,
Tendo por trompa o Verbo Sacrosanto.

Aquella voz foi elle sonorosa,
No concavo dos Orbes resonante,
E que a Carne inculpavel baptizou;

Quem do mor Pae ouvio a voz amante;
Quem a subtil pergunta industriosa
Com sincera resposta socegou.



CCXLV.

Vós só podeis, sagrado Evangelista,
Angelico abrazado Seraphim,
E na sciencia mais alto Cherubim,
Do que he mais sabio Amor ser Coronista.

Divina e real Aguia, cuja vista
Vio o qu'he sem princípio, o qu'he sem fim,
De Jacob mais querido Benjamim,
Quem mais campêa de Joseph na lista.

Apostolo, e Propheta, e Patriarca,
Ao Principe dos Ceos o mais acceito,
Qu'em seu seio dormindo então mais via.

A quem o mesmo Deos por irmão marca;
Quem por filho da Mãe unica feito,
Em corpo e alma goza o claro dia.