Página:Obras completas de Luis de Camões II (1843).djvu/213

CCLXXVI.
Na ribeira do Euphrates assentado,
Discorrendo me achei pela memoria
Aquelle breve bem, aquella gloria,
Que em ti, doce Sião, tinha passado.
  Da causa de meus males perguntado
Me foi: Como não cantas a historia
De teu passado bem, e da victoria
Que sempre de teu mal has alcançado?
  Não sabes, que a quem canta se lhe esquece
O mal, indaque grave e rigoroso?
Canta pois, e não chores dessa sorte.
  Respondi com suspiros: Quando crece
A muita saudade, o piedoso
Remedio he não cantar, senão a morte.
CCLXXVII.
Chorai, Nymphas, os fados poderosos
Daquella soberana formosura.
Onde forão parar? na sepultura?
Aquelles Reaes olhos graciosos?
  Oh bens do mundo falsos e enganosos!
Que mágoas para ouvir! Que tal figura
Jaza sem resplandor na terra dura
Com tal rosto e cabellos tão formosos!
  Das outras que será! pois poder teve
A morte sôbre cousa tanto bella,
Que ella eclipsava a luz do claro dia.
  Mas o mundo não era digno della,
Por isso mais na terra não esteve,
Ao ceo subio, que ja se lhe devia.{140}