Os audazes, que sempre estavam juntos,
Como só derribou?» — E a nutriz: «Nada
Eu vi, nem mo contaram, mas ouvia
O estrondo, o pranto, os ais dos moribundos,
Lá nos retretes, a trancadas portas,30
Em susto éramos todas, e teu filho
Por ordem paternal veio chamar-me.
Achei teu bravo Ulysses entre os mortos
Uns por cima dos outros: exultaras
De o ver leão sangrento e encarniçado!35
Ele, fora os cadaveres em montes,
Fumiga o paço, e ordena que me sigas,
Anda, ambos de alegria abeberai-vos,
Depois de tantas mágoas; a tão longa
Saudade se mitigue. Ele nos torna40
Vivo e são; cá te encontra e o filho vosso;
Puniu já desta casa os malfeitores.»

Logo a rainha: «A rir não te glories.
Sim, grata a vinda sua a todos fora,
Mormente a mim e ao filho que geramos;45
Porém, ama, não creio o que me afirmas:
Indignado algum nume de arrogâncias
E injurias tais, livrou-nos de insolentes
Que a ninguém, por melhor, tinham respeito;
Mas longe Ulysses acabou decerto.»50

«Filha, insiste Euricléia, que proferes?
Duvidas inda, e ao lar já tens o esposo!
É muito. Ora um sinal te manifesto:
Ao laval-o, do cerdo conheci-lhe
A cicatriz. Eu ia annunciar-to,55
Cauto a boca tapou-me. Vem; consinto,
Mata-me, se te engano.» — «É-te impossível,
Penélope argüiu, por mais ciente,
O arcano, amiga, perceber divino.
Contudo, ao filho corro; esses perversos,60
Aquele que os prostou, meus olhos vejam.»

Desce, do caro esposo revolvendo
Se as mãos e as faces beije, ou tão sómente
O interrogue distante. Já transposto
O pétreo limiar, defronte, ao lume,65