OS MAIAS
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guerras civis, e o calmavam indo em bando varrer botequins ou rebentando pilecas de sejes em galopadas para Cintra. Cintra era então um ninho de amores, e sob as suas romanticas ramagens as fidalgas abandonavam-se aos braços dos poetas. Ellas eram Elviras, elles eram Antonys. O dinheiro abundava; a côrte era alegre; a Regeneração litterata e galante ia engrandecer o paiz, bello jardim da Europa; os bachareis chegavam de Coimbra, frementes de eloquencia; os ministros da corôa recitavam ao piano; o mesmo sopro lyrico inchava as odes e os projectos de lei...

— ­Lisboa era bem mais divertida, disse Carlos.

— ­Era outra cousa, meu Carlos! Vivia-se! Não existiriam esses ares scientificos, toda essa palhada philosophica, esses badamecos positivistas... Mas havia coração, rapaz! Tinha-se faisca! Mesmo n’essas cousas da politica... Vê esse chiqueiro agora ahi, essa malta de bandalhos... N’esse tempo ía-se alli á camara e sentia-se a inspiração, sentia-se o rasgo!... Via-se luz nas cabeças!... E depois, menino, havia muitissimo boas mulheres.

Os hombros descahiam-lhe na saudade d’esse mundo perdido. E parecia mais lugubre, com a sua grenha d’inspirado sahindo-lhe de sob as abas largas do chapéo velho, a sobrecasaca coçada e mal feita collando-se-lhe lamentavelmente ás ilhargas.

Um momento caminharam em silencio. Depois, na rua das Janellas Verdes, o Alencar quiz refrescar. Entraram n’uma pequena venda, onde a mancha amarella d’um candieiro de petroleo destacava n’uma penumbra de subterraneo,