OS MAIAS
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fitas de laçar. A um canto estava um cesto acolchoado de seda côr de rosa, onde de certo viajara a cadellinha.

Mas o olhar de Carlos prendia-se sobre tudo a um sophá onde ficará estendido, com as duas mangas abertas, á maneira de dous braços que se offerecem, o casaco branco de velludo lavrado de Genova com que elle a vira, a primeira vez, apear-se á porta do hotel. O forro, de setim branco, não tinha o menor acolxoado, tão perfeito devia ser o corpo que vestia: e assim, deitado sobre o sophá, n’essa attitude viva, n’um desabotoado de semi-nudez, adiantando em vago relevo o cheio de dois seios, com os braços alargando-se, dando-se todos, aquelle estofo parecia exhalar um calor humano, e punha ali a fórma d’um corpo amoroso, desfallecendo n’um silencio d’alcova. Carlos sentiu bater o coração. Um perfume indefinido e forte de jasmim, de marechala, de tanglewood, elevava-se de todas aquellas cousas intimas, passava-lhe pela face com um bafo suave de caricia...

Então desviou os olhos, approximou-se da janella, que tinha por perspectiva a fachada enxovalhada do hotel Shneid. Quando se voltou, miss Sarah estava diante d’elle, vestida de preto e muito córada: era uma pessoa sympathica, redondinha e pequena, com um ar de rola farta, os olhos sentimentaes, e uma testa de virgem sob bandós lisos e louros. Balbuciava umas palavras em francez, em que Carlos só percebeu docteur.

— ­Yes, I am the doctor, disse elle.