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OS MAIAS

Ficavam só dois animaes, nascidos do mesmo ventre, juntando-se a um canto como cães, sob o impulso bruto do cio!

Correu para o seu quarto, fugindo áquella visão a que o escuro do corredor, mal dissipado pela luz tremula, accentuava mais o relêvo. Aferrolhou a porta; accendeu á pressa sobre o toucador, uma depois da outra, com a mão agitada, as seis velas dos candelabros. E agora apparecia-lhe mais urgente, inevitavel, a necessidade de contar tudo a Carlos. Mas ao mesmo tempo sentia em si, a cada instante, menos animo para chegar, encarar Carlos, e destruir-lhe a felicidade e a vida com uma revelação d’incesto. Não podia! Outro que lh’o dissesse! Elle lá estava depois para o consolar, tomar metade da sua dôr, carinhoso e fiel. Mas o desgosto supremo da vida de Carlos não viria de palavras cahidas da sua boca!... Outro que lh’o dissesse! Mas quem? Mil idéas passavam na sua pobre cabeça, incoherentes e tontas. Pedir a Maria que fugisse, desapparecesse... Escrever uma carta anonyma a Carlos, com a detalhada historia do Guimarães... E esta confusão, esta anciedade ia-se resolvendo lentamente em odio ao snr. Guimarães. Para que fallára áquelle imbecil? Para que insistira em lhe confiar papeis alheios? Para que lh’o apresentára o Alencar? Ah! se não fosse a carta do Damaso... Tudo provinha do maldito Damaso!

Agitando-se pelo quarto, ainda de chapéo, os seus olhos cahiram n’um sobrescripto pousado sobre