trabalho multiplicado por si mesmo, o engolimento possivel do salvador no salvamento, a fome, a febre, a nudez, o abandono, tudo isso tomou elle para si só. Teve este egoismo.
Gilliatt estava debaixo de uma especie de machina pneumatica. A vitalidade ia-se retirando delle a pouco e pouco. E elle mal o sentia.
A perda das forças não esgota a vontade. Crer é apenas a segunda potencia; a primeira é querer; as montanhas proverbiaes que a fé transporta nada valem ao lado do que a vontade produz. O que Gilliatt perdia em vigor, rehavia em tenacidade. A diminuição do homem physico debaixo da acção repellente daquella natureza selvagem produzia o engrandecimento do homem moral.
Gilliatt não sentia a fadiga, ou para melhor dizer, não consentia nella. O consentimento da alma recusado ao desfalecimento do corpo é uma força immensa.
Gilliatt via os progressos do trabalho, e não via nada mais. Era miseravel sem sabel-o. O seu alvo, que elle tocava quasi, allucinava-o, soffria todos os soffrimentos sem ter outra idéa que não fosse esta: Avante! A sua obra subia-lhe á cabeça. Vontade embriagada. O homem póde embriagar-se com a propria alma. Essa embriaguez chama-se heroismo.
Gilliatt era uma especie de Job do Oceano.
Mas um Job que lutava, um Job que combatia e affrontava os flagellos, um Job que conquistava, e se taes palavras não são demasiado grandes para um pobre marinheiro pescador de carangueijos A de lagostas, um Job Prometheu.