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se ia fazendo. Essa muralha do ar subia de uma só peça e silenciosamente. Nenhuma ondulação, nenhuma dobra, nenhuma saliencia. Era lugubre aquella immobilidade em movimento. O sol, livido por traz de uma certa transparencia morbida, alumiava aquelle lineamento de apocalipse. A nuvem invadia já quasi metade do espaço. Dissera-se o medonho talude do abysmo. Era uma como que levantar de montanha de sombra entre a terra e o céo.

Era em pleno dia a ascenção da noite.

Havia no ar um calor de fogão. Uma lixivia de estufa sahia daquelle amontoado mysterioso. O céo, que de azul tornára-se branco, de branco tornou-se cinzento. Dissera-se uma grande ardosia. Embaixo o mar escuro e de chumbo, era outra ardosia enorme. Nem um sopro, nem um rumor. Ao longe o mar deserto. Nenhuma vela. Os passaros tinham-se escondido. Sentia-se a traição do infinito.

O crescimento de toda aquella sombra amplificava-se insensivelmente.

A montanha movediça de vapores que se dirigia para as Douvres, era uma dessas nuvens que se podem chamar nuvens de combate. Nuvens vesgas. Atravez daquelles amontoados escuros, extranho estrabismo fita o homem.

Temivel era a approximação.

Gilliatt examinou firmemente a nuvem e murmurou entre dentes: «Tenho sede, vás dar-me agua.»

Ficou alguns momentos immovel com os olhos fitos na nuvem. Parecia medir a tempestade.