E sonho o que nenhum mortal ha já sonhado,
Mas o silencio amplo e calado,
Calado fica; a quietação quieta;
Só tu, palavra unica e dilecta,
Lenora, tu, como um suspiro escasso,
Da minha triste boca saes;
E o eco, que te ouviu, murmurou-te no espaço;
Foi isso apenas, nada mais.
Entro co’ a alma incendiada.
Logo depois outra pancada
Sôa um pouco mais forte; eu, voltando-me a ella:
«Seguramente, ha na janella
«Alguma cousa que sussura. Abramo
«Eia, fôra o temor, eia, vejamos
«A explicação do caso mysterioso
«D’essas duas pancadas taes.
«Devolvamos a paz ao coração medroso,
«Obra do vento e nada mais.»
Abro a janella, e de repente,
Vejo tumultuosamente
Um nobre corvo entrar, digno de antigos dias.
Não despendeu em cortezias
Um minuto, um instante. Tinha o aspecto
De um lord ou de uma lady. E prompto e recto
Movendo no ar as suas negras alas,
Acima vôa dos portaes,
Trepa, no alto da porta, em um busto de Pallas;
Trepado fica, e nada mais.
Página:Poesias Completas (Machado de Assis).pdf/317
OCCIDENTAES
301
